terça-feira, 8 de maio de 2018

Entreato


Ter, na sombra,  aquela fidalguia da individualidade 
que consiste em não insistir em nada para com a vida.
(Livro do desassossego)




às vezes,

              não tenho paciência com os sons. Quaisquer.

me cansam também as imagens, como o sol com seu céu azul pontual

todo dia sempre belo,
e as flores minguam porque a terra se empoeira
e as folhas de verdes que eram, tornam-se cores dobradas, esquecidas pelo chão onde as formigas não passeiam.


É quando às vezes me sento, sob minha mão que sustenta a circunspecção dos músculos perplexos:
o que sei fazer de melhor é estar absorta.

Por-me sentada ao abrigo dos meus olhos, à sombra de cortinas castanhas fechadas, a qual para este sol lhe dá as costas.

Agora,
estou diante do inevitável deste instante, como partícipe das despedidas
e a impressão que tenho é que, dentro em breve, virão buscar a hora para colocá-la no pra sempre.

Chego antes das minhas lágrimas. Não sei se incomodadas com o imprevisto,
se ausentaram porque não mais inesperadas.

Indiferente.
As lágrimas me colecionam a todo momento
aguam a esperança que se perdeu do mapa guia das mágoas,
escorrem perdidas pelo átrio das solidões,
e depois voltam a secar.


quarta-feira, 2 de maio de 2018

Le guetteur mélancolique









Et toi mon coeur pourquoi bats-tu
Comme un guetteur mélancolique
J'observe la vie et la mort.

(Appollinaire)



E você meu coração por que bate você
Como um vigia melancólico
Eu observo a vida e a morte.






"Roda infantil" - Cândido Portinari,1932