domingo, 4 de fevereiro de 2024

sem pé, nem cabeça

 A pequena donzela acredita em certas invenções que a fizeram entender - por via de mão única - o que é o amor. É exigente, em sua expectativa de jovem coração sentinte. Excessivamente magoado, pois o mundo amoroso é outra coisa que descobriu que não sabe.

A jovem dama aprende, lentamente, a caminhar descalça. Disposta da metade do séquito de seus pensamentos fiéis na obsessão por dominar a natureza de tudo o que conhece. Mal. 

Por vezes, esta mulher petite fille deseja o colo soberano de todo o sol no azul. Luz somente para ela. Mas, a luz é de campo e não de jardim. Mãos monárquicas com gesta de roça. Semear, adubar. Tempo certo de colheita.

Cafezal.

Perdeu-se. Desacostumada no não ter. Ou ter de outro jeito. Ser de outro modo é capinar.

sem o esforço de se esperar somente o que sequer... pois tudo é caminho.

sexta-feira, 20 de outubro de 2023

indiferença olfativa

Sinto-me isolada pela incapacidade de não sentir o mundo

pelos seus cheiros.

Sinto-me entristecida. Um pouco desumana. Posto que me esvaio também em desafeto.

Degusto o frio, o quente. Sem mais, nem menos.

Não consigo alegrar-me

tudo é uma interminável indiferença insípida. enquanto espero cercada por este definitivo ornado de nada.

Toda a experiência se encapa de cinza.

Esqueci-me de todas as outras cores. nem me lembro se algum dia existiram mesmo na minha existência.

Me esqueço. Tão sozinha.Inumana. 

Um restolho de pó.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2023

Toque de recolher

 A ansiedade toca sua sirene ensurdecedora.

Possibilidade de bombardeio.

Onde, se tudo se encontra já devastado?

Escombros em ocos imaginários.

Torpedos de canções de ninar.

choros de terra seca.

Pó de barulho

Sobressalto inerte.

meu abrigo de papel celofane

minha solidão se intercala na companhia de toda orfandade do mundo.


sábado, 26 de novembro de 2022

A prima Estrela

 Desde criança, quando ela nos visitava no interior, sempre pude enxergar sua estrela. Pois era um rastro luminoso de vida que acontecia.

Embora o amor se chama Rosa, Elisa sempre foi um deslumbramento. Amava e amo seu perfume. Seu sorriso vivo, seus lábios escarlates, suas unhas em combinações rubras, intensas e de novo vivas.

Houve uma tarde de chuva repentina. Houve um saco de supermercado como chapéu na cabeça, retornando pra casa da avó. Risadas de criança pela rua! Houve alegria. Houve vida outra vez. Houve muitas visistas às suas primas e eu, criança, me sentia participante de sua vida. Me sentia viva junto de você.

Sua visita sempre me foi um presente de alegria. E de novo o perfume inconfundível, a beleza singular. De um estonteante simples, ágil, sorridente, sonoro, bondoso...

Depois de algum tempo, Elisa Estrela modalizou esse brilho todo. Mesmo a desilusão, a meu ver, perdia terreno quando a ela fazia companhia constante. Numa ocasião, momento em que fui eu a visita em sua casa, de retorno pro interior, chorei muito. Pois era cúmplice o sentimento de orfande e de abandono. Quis tanto que seu percurso incandescente fosse outro. Mas, o que sei eu sobre sua vida, Elisa Stela Estrela?

Creio que nunca verei tanta vida de novo em alguém. Tanta intensidade e franqueza. Tanta entrega. Por isso, as lágrimas calam minha garganta que,  dolorida e muda, vai me modificando outra vez.

Quero que saiba que a amo. Que sempre a  amei. E que pra mim, você é a prima mais legal. Embora, o amor tenha o nome de Rosa Maria.

Em meu ser o seu perfume. Em minha vida a sua intensidade brilhante, tragicamente divertida. 

Maravilhosa de tão brilhante!

Eu amo você. Até o derradeiro ano-luz desse meu existir pequenino, humilde, desamparado no momento. Eu amo você, prima Elisa Stela Estrela.

Obrigada por incandescer a minha vida!

Sua,

Marcinha.



quinta-feira, 22 de setembro de 2022

Devaneios

 Estar mais consciente de minha inerente condição de exílio... Optar por ela. Conhecê-la mais a fundo.

Desde que me conheço por ser, conheço bem os aspectos sombrios e dolorosos dessa jornada. Sempre me deixando envolver somente pelas sombras, sem que calmamente eu optasse por conhecer novs aspectos dessa experiência. Outros silêncios chegam agora até mim.

Ficar na autocompanhia, como ensina Montaigne. Só que sem teorias. Ora absurdada, ora esclarecida, ora temerosa,  ora triste, ora brava, ora renascida. Conhecendo em mim o que um dia conheci lendo.

Talvez algumas maravilhas incandescentes aparecem-me num instante. Os ramos festivos dos pinheiros. Seus velhos braços familiares revisitados sob ângulos nublados, frescos, internos... Por que perder isso? Não! Agora insisto em esperar e continuar meus movimentos neste percurso.

Reassumir apressadamente personagens infantis e sênis, sob o teto conhecido do meu lar talvez seja desertar. Pois optar por  única via, talvez me seja restringir.

Opto por reverenciar a exilada. A que anda, caminha, a que vaga, vaga aprendendo-se no mundo que é grande. Tão grande! Tão vasto. E passageiro em meus recônditos.

Aceito solenemente, a dádiva doidivanas
do que sou!


Obrigada por brincarem comigo.

Araraquara, 22 de setembro de 2022

                                                     

quarta-feira, 14 de setembro de 2022

Instantâneo

 Meteorologia interna do momento:

faz sol. Doce. Aqueles raios amenos na imaginação.

Diria um sol do fim dos tempos. Trombetas em algum lugar.

mas faz silêncio.


Não é sol do meio dia. Nem tampouco de amanhecer.

É sol de hora nenhuma. Aquela volta do ponteiro inexistente.

É bom.


De repente, aquela nuvem... aquela!

Não é nuvem de chuva. Não é nuvem esperançosa. Não é nuvem de nada.

O céu foi inventado também

e apagou-se por alguns instantes.


Ah! que medo dessa nuvem velha conhecida. Tão velha quanto o tempo que me desconheço.

Talvez seja malsã: diz a imaginação

Talvez não.

E eu é que sei?!


Sei que é aquela nuvem que me põe medo porque sei que aí vêm minhas perguntas.

E aquelas tentativas de "eu estou bem!" "eu estou bem!" "eu estou bem!" "Cadê o sol"??? "Cadê o soooollll?"

Venta num suspiro. Com raspas de limão.

Espera o olhar apoiado no cotovelo esquerdo.

Calmaria

Até já esqueci se vai chover.

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

O novo normal

 

Descendo embarcados num carrinho de ‘Montanha Russa’ enferrujado:

sem paisagem do alto,

com o trilho todo encarquilhado,

e a criança sozinha, sem cinto de segurança.

 

Isso tudo é, de certo modo, algum tipo de adrenalina reversa?