Eu preferiria compreender bem a mim mesmo
a compreender Cícero
(Montaigne)
Comunicação, não violência são experiências que têm me visitado com muita frequência ultimamente. Posto que disponho de algum tempo livre inesperado.
Sempre achei que soubesse colocar o tempo livre a meu gosto, mas, na verdade, descubro que não. E descubro que sim e que talvez. Mas, que, definitivamente, sempre permiti que colocassem meu tempo onde não o haviam chamado. Então, disponho do meu tempo livre inesperado de maneira a descobri-lo sob outros ângulos - os ângulos das muitas partes que tenho sido.
Existe em mim um pilar. Mas, muitas cadeias de montanhas. Montes, colinas e vales. E depressões seguidas de cumes. Planaltos e planícies de espera. Um ser que isso tudo escala e outro que dele tomba. Uma parte que deseja o ápice do rarefeito e outra que o rejeita. Uma e outra, às vezes, discutem se o sexo dos anjos é mesmo a androginia. O que não tem nada a ver com a conversa inicial. Mas, tudo bem!
Não tem problema algum se alguma parte minha tiver o hábito de doer e se a tal, como os polvos que adornam o lugar onde se escondem com a ajuda de conchas, enfeitar seus hematomas existenciais com suítes de Bach, sonatas de Beethoven ou noturnos de Chopin.
Sem grandes problemas se outra parte puser-se surda perante alguns acordes amados. Ou se estiver muda em algum momento e não mais ler em voz alta a palavra "marítimo". Tudo bem!
E se outra parte quiser se sentar? Sem grandes queixas!
E se chegar outro alguém que sou e quiser chorar pelo fato de não compreender a intenção da solidão de todo dia? Tudo certo!
Tudo bem se uma parte quiser desistir? Sim!
E outra continuar tentando? Também!
Uma parte que sou jejua! Mas, outra se entorpece de "vinho, poesia ou virtude". E parece que todas constatam o peso que é viver, sem contudo se importar de permitirem que a sensação passe, abra a porta principal e tome acento na poltrona predileta de frente ao pôr-do-sol.
O tempo livre que aprendo experimentar me propõe frequentar ante- salas e coxias. Talvez jardins ou mesmo palcos de folhas secas. Bosques de refletores apagados. E novos jardins dispersos.
E tudo torna-se um acolher enorme dessas possibilidades. A toda hora. Em qualquer lugar ou tempo.
E tudo fica certo de novo, ainda que eu não saiba ao certo o caminho correto de ida e volta para mim.
Tudo bem em sumir e aparecer que no que tenho sido. Porque, nas conclusões provisórias, há paz em ser tudo que sou.
Há paz na mudança de ser eu mesma.
*
Ps: Quando uma parte estiver desabando por completo, sugestão de escuta: "Noturno em C menor" - Chopin. Para a delicadeza de uma melancolia muito bem trabalhada: "Suite Francesa n. 2" - Bach. E tem também "A Passionata" do Beethoven que cobre com manto sagrado qualquer desespero! :D
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