terça-feira, 19 de setembro de 2017

"Velho estilo"

Coisa que passas, como é teu nome?
De que inconstâncias foste gerada?
Abri meus braços para alcançar-te:
fechei meus braços - não tinha nada!

De ti só resta o que se consome.
Vais para a morte? Vais para a vida?
Tua presença nalguma parte
é já sinal da tua partida.

E eu disse a todos desse teu fado,
para esquecerem teu chamamento,
saberem que eras constituída
da errante essência da água e do vento.

Todos quiseram ter-te, malgrado
prenúncios tantos, tantas ameaças.
Grande, adorada desconhecida,
como é teu nome, coisa que passas?

Pisando terras e firmamento,
com um ar de exausta gente dormida,
abandonaram termos tranquilos,
portas abertas, áreas de vida.

E eu, que anunciei o acontecimento,
fui atrás deles, com insegurança,
dizendo que ia por dissuadi-los,
mas sendo a sua mesma esperança.

No ardente nível desta experiência,
sem rogo, lágrima nem protesto,
tudo se apaga, preso em sigilos:
mas no desenho do último gesto,

há mãos de amor para a tua ausência.
E esse é o vestígio que não some:
resto de todos, teu próprio resto.
- Coisa que passas, como é teu nome?

Cecília Meireles - Vaga música (1942)

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